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Águas de março

data-filename="retriever" style="width: 100%;">O último final de semana do verão foi com muito sol, calor e céu azul. Foi um verdadeiro presente da natureza para compensar os dias sombrios que assolam o nosso Estado, nessas últimas semanas. O verão se despede e com ele se vão os dias claros e ensolarados. Começa um período de nostalgia, que precede as folhas amareladas no chão. As manhãs ficam mais sombrias e o sol é encoberto pela cerração. As noites são mais longas, frias e silenciosas. Aos poucos, a chuva começa a chegar e em uma linguagem mais poética e inspirada em uma das composições mais famosas de Tom Jobim, diria que são as águas de março fechando o verão.

Aliás, Águas de Março, que já foi considerada a melhor música brasileira de todos os tempos, tem uma relação muito estreita com o momento atual. Ela foi inspirada na obra de Olavo Bilac, O Caçador de Esmeraldas e foi escrita, segundo o próprio Tom, "num período que estava muito na fossa". A composição é de março de 1972, período em que o compositor, por não estar em uma fase muito boa, resolveu passar uns dias em seu sítio Poço Fundo, na região serrana do Rio de Janeiro.

A casa do sítio estava em reforma, por isso a letra menciona caco de vidro, prego, viga e vão. Por meio de versos pessimistas e otimistas, ele mostra a dualidade da vida. Da infernal solidão, retratada no "é o fundo do poço", da aguda sensação de morte em vida: "é o fim do caminho", o sujeito consegue se reconstruir, com os ritmos do dia e do trabalho: "É a luz da manhã", "é o tijolo chegando". As imagens criadas pelas palavras, inicialmente isoladas, começam a se encaixar nos movimentos da construção, da reforma da casa, mostrando o esforço humano na busca por um novo objetivo: "É o projeto da casa". A música mostra que, na simplicidade da vida cotidiana, na contemplação dos fenômenos da natureza: "é o vento ventando", "a chuva chovendo" e o "pingo pegando", é possível uma reconstrução interior.

Contudo, a metáfora central da composição é mostrar que a água não representa um fim. Neste caso, a água é o símbolo da renovação, a imagem de uma promessa. Tom Jobim, anos depois, ao falar sobre o sucesso da obra disse: "Águas de Março teve um significado especial na minha vida, ela abriu um novo ciclo criativo".

Que as águas de março não apenas fechem o verão, mas que elas possam ser uma promessa, não necessariamente de coisas novas, mas de retorno à normalidade, de uma vida mais estável para trazer paz aos nossos corações.

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